A responsabilidade criminal emana do cometimento de crime ou contravenção, ficando o infrator sujeito à pena de perda da liberdade ou a pena pecuniária. Há, pois, dois tipos de infração penal: o crime e a contravenção. O primeiro constitui-se de ofensas graves a bens e interesses jurídicos de alto valor, de que resultam danos ou perigos próximos, de onde as duas categorias de crime - de dano e de perigo -, a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, acumulada ou não com multa. O segundo refere-se a condutas menos gravosas, apenas reveladoras de perigo, a que a lei comina sanção de pequena monta, prisão simples ou multa. Na verdade, a lei é que vai dizer o que é contravenção e o que é crime. Assim é que, no sistema brasileiro, crime é a infração a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternada ou cumulativamente com a pena de multa; enquanto contravenção é a infração penal a que a lei comina, isoladamente, a pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternada ou cumulativamente.
A distinção com base na natureza da pena - reclusão ou detenção - tem hoje, porém, pouca significação, visto que no Código Penal reformado pela Lei 6.416, de 1977, a diferença entre os dois tipos de pena praticamente desapareceu. Importa, agora, a classificação do art. 32, segundo o qual as penas são:
I - privativas de liberdade;
II - restritivas de direitos;
III - de multa.
É certo que o art. 33 ainda diz: "A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semifechado ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado". Tudo vale como dizer, em verdade, que a diferença entre crime e contravenção depende apenas de a lei definir uma conduta delitiva como crime ou como contravenção. Fora disso não há como distinguir um da outra.
2. Crimes contra o meio ambiente
Qualquer infração penal só é tal enquanto assim prevista em lei. O princípio da legalidade, aqui, é de aplicação rigorosa. Só é crime aquilo - e somente aquilo - que a lei prescreve como tal. Só é contravenção penal a conduta assim definida em lei. Não há crime (nem contravenção penal) sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.
Os crimes contra o meio ambiente, ou crimes ecológicos, ou crimes ambientais, só existem na forma definida em lei e só quando definidos em lei.
A qualidade do meio ambiente é um valor fundamental, é um bem jurídico de alta relevância, na medida mesma em que a Constituição o considera bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida, que o Poder Público e a coletividade devem defender e preservar. A ofensa a um tal bem revela-se grave e deve ser definida como crime. A Constituição declara que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores a sanções penais (art. 225, § 3º). Deixa à lei definir tais infrações como crime ou contravenção.
O Código Penal e outras leis definiam crimes ou contravenções penais contra o meio ambiente. Todas essas leis que definiam crimes ambientais foram revogadas pela Lei 9.605, de 12.2.1998, que dispôs sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente. Essa lei separou os crimes segundo os objetos de tutela, assim: crimes contra a fauna (arts. 29-37), crimes contra a flora (arts. 38-53), poluição e outros crimes (arts. 54-61)13 e
Crimes contra a fauna: são várias as figuras penais destinadas à proteção da fauna, com as respectivas circunstâncias. Assim:
I - Incorre na pena de detenção de seis meses a um ano, e multa, quem matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida; na mesma pena incorre quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida, e quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural, e ainda quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como rodutos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros nãoautorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente (art. 29).
II - Mais grave é exportar para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis em bruto sem a autorização da autoridade ambiental competente, porque para esse crime a lei prevê reclusão de um a três anos, e multa (art. 30).
III - Mais leve é introduzir espécime animal no país sem parecer técnico oficial favorável e licença expedida por autoridade competente, porque para essa infração só é prevista a pena de detenção de três meses a um, ano e multa (art. 31).
IV - Também é apenado com detenção de três meses a um ano, e multa, o crime definido no art. 32: praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Nessa mesma pena incorre quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. Se o animal morre a pena é aumentada de um sexto a um terço.
V - De um a três anos, multa, ou ambas cumulativamente, é a pena pelo crime de provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas; baías ou águas jurisdicionais brasileiras, incorrendo na mesma pena (a) quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aqüicultura de domínio público, (b) quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas sem licença, permissão ou autorização da autoridade competente, (c) quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de moluscos ou corais devidamente demarcados em carta náutica.
VI - Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgãos competentes constitui crime punível com detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente. Na mesma pena, incorre quem (a) pesca espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos permitidos, (b) pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não-permitidos, (c) transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta, apanha e da pesca proibida.
VII - Pescar mediante a utilização de explosivos ou substâncias que produzam efeitos semelhantes, substâncias tóxicas ou outro meio proibido pela autoridade competente é crime sujeito à pena de reclusão de um a cinco anos.
Finalmente, a lei não considera crime o abate de animal quando realizado em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família, ou para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais, desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente, ou ainda por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente.
Crimes contra a flora: são os seguintes:
I - Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-Ia com infringência das normas de proteção: pena de detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente. Reduz-se a pena de metade se o crime for culposo (art. 38).
II - Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente sem permissão da autoridade competente: pena de detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente (art. 39).
III - Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas que as circundam num raio de 10 km, independentemente de sua localização: pena de reclusão de um a cinco anos (art. 40), considerando-se por Unidade de Conservação, para tal efeito, as Reservas Biológicas, Reservas Ecológicas, Estações Ecológicas, Parques Nacionais, Estaduais e Municipais, Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais, Áreas de Proteção Ambiental, Áreas de Relevante Interesse Ecológico e Reservas Extrativistas, ou outras a serem
criadas pelo Poder Público.
IV - Provocar incêndio em mata ou floresta: pena de reclusão de dois a quatro anos, e multa. Se o crime é culposo a pena é de detenção de seis meses a um ano, e multa (art. 41).
V - Fabricar, vender, transportar ou soltar balão que possa provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano: pena de detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente (art. 42).
VI - Extrair de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente, sem prévia autorização, pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais: pena de detenção de seis meses a um ano, e multa (art. 44).
VII - Cortar ou transportar em carvão madeira de lei, assim classificada por ato do Poder Executivo, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não, em desacordo do com as determinações legais: pena de reclusão de um a dois anos e multa (art. 45).
VIII - Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais. madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento: pena de reclusão de um a dois anos e multa (art. 46). Incorre na mesma pena quem vende, expõe à venda, e tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento, outorgada pela autoridade competente.
IX - Impedir ou dificultar a regeneração natural de floresta ou demais formas de vegetação: pena de detenção de seis meses a ou ano, e multa (art. 48).
X - Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia: pena de detenção de três meses a um ano ou multa, ou ambas cumulativamente. Se o crime é culposo a ano, será de um a seis meses, ou multa (art. 49).
XI - Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação: pena de detenção de três meses a um ano, e multa (art.50).
XII - Comercializar motosserra ou utilizá-Ia em florestas e nativas e nas demais formas de vegetação sem licença ou registro da autoridade competente: pena de detenção de três meses a um ano, e multa (art. 51).
XIII - Penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos próprios para caça ou para exploração de produtos ou subprodutos florestais sem licença da autoridade o de competente: pena de detenção de seis meses a um ano, e multa (art. 52).
XIV - Em todos os casos supra a pena é aumentada de um sexto a um terçose (a) do fato resulta a diminuição de águas naturais, a erosão do solo ou a modificação do regime climático, (b) o crime cometido: (1) no período de queda das sementes, (2) no período de formação de vegetação; (3) contra espécies raras ou ameaçadas de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no local da infração; (4) em época de seca ou inundação; (5) durante a noite, em domingo ou feriado (art. 53).
Poluição e outros crimes ambientais são os seguintes:
I - Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: pena de reclusão de um a quatro anos, e multa. Essa pena será aumentada de um a cinco anos se o crime (a) tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para ocupação humana, (b) causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas ou que cause danos diretos à saúde da população, (c) causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade, (d) dificultar ou impedir o uso público das praias, (e) ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos. Também incorre na mesma pena quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível. Se,porém, o crime for culposo a pena será de detenção de seis meses a um ano, e multa (art. 54).
II - Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes: pena de detenção de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente (art. 60).
III - Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida: pena de detenção de seis meses a um ano, e multa (art. 55).
IV - Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos: pena de reclusão de um a quatro anos, e multa. Na mesma pena incorre quem abandona os produtos ou substâncias referidos acima, ou os utiliza em desacordo com as normas de segurança. E se o produto ou substância for nuclear ou radioativo a penas é aumentada de um sexto a um terço. Se o crime é culposo a pena será de detenção de seis meses a um ano, e multa (art. 56).
V - Disseminar doença ou praga ou espécies que possam causar dano à agricultura, à pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas: pena de reclusão de um a quatro anos, e multa (art. 57).
Crimes contra a Administração Ambiental: são os seguintes:
I - Fazer o funcionário público afirmação falsa ou enganosa, omitir a verdade, sonegar informações ou dados técnico-científicos em procedimentos de autorização ou de licenciamento ambiental: pena de reclusão de um a três anos, e multa (art. 66).
II - Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público: pena de detenção de um a três anos, e multa. Se o crime é culposo a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa (art. 67).
III - Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental: pena de detenção de um a três anos, e multa. Se o crime é culposo a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa (art. 68).
IV - Obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público no trato de questões ambientais: pena de detenção de um a três anos, e multa (art. 69).
Fonte: Código Penal e Ambiental
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